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ARACY DE ALMEIDA: DE NOEL A CAETANO, A DAMA ENCANTADA DA MPB
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15 de fevereiro de 2024 por Nísio Teixeira  
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No festival “Cenas Curtas”, do Grupo Galpão, apresentei a minha minipeça “O dia em que Noel Rosa foi gongado ou Tu vais levar dois mangos para deixar de ser cara-de-pau”, uma chanchada tropicalista que narra um encontro imaginário (“post-mortem”) da cantora Aracy de Almeida (1914-1988) com o compositor Noel Rosa (1910-1937). Depois de morrer, Aracy aguarda na ante-sala de São Pedro. Como fã da cantora, o “porteiro do céu” (São Pedro-Cover) deixa a artista fazer três pedidos. Já no primeiro pedido (o direito a um porre homérico), as coisas se complicam. Aracy, bêbada, acha que o porteiro é Noel Rosa e se julga uma grande compositora que encontra o seu principal intérprete (Noel Rosa). A partir dessas inversões de papéis (porteiro ‘vira’ Noel Rosa; intérprete ‘vira’ compositora; e compositor, intérprete), acontece um quiproquó do infernos. A cena curta contou com os atores Ana Gusmão (como Aracy de Almeida) e Alfredo Vianna (como o auxiliar de São Pedro), e, na direção, Rodrigo Sgnoretti (“Caju”). Para continuar recordando dessa cantora fantástica que foi Aracy de Almeida, eis um remix, em forma de breve ABC-biodiscográfico. ARACY DE ALMEIDA – Aracy Teles de Almeida, nasceu no subúrbio carioca de Encantado, em 19/8/1914, filha de Baltazar Teles de Almeida (chefe da Central do Brasil). Morreu em 20/06/1988. AO VIVO E À VONTADE – Foi o último álbum gravado por Aracy, lançando, postumamente, em 1988. Com produção de Zé Rodrix & Tico Terpins (ambos integrantes do grupo Joelho de Porco), o álbum, com 11 músicas de Noel Rosa, foi gravado ao vivo no Teatro Lira Paulistana, em 30/08/1980. ARACA – Apelido de Aracy de Almeida. A lenda diz que o apelido foi dado pelo costureiro Denner. Mas Aracy ficou conhecida pelo epíteto “O samba em pessoa”, dado pelo radialista César de Alencar. BATE-BOLA – Em outubro de 1954, o número 01 da “Revista de Música Brasileira” publicou um bate-bola de Aracy com o jornalista Lúcio Rangel. Remix: Gosta de Cantar? Muito. / E de homem? Adoro. / Que acha de Noel Rosa? Divino. / E Pixinguinha? Idem. / Gosta de comida? Um pouco chato a gente ter de comer. / Que acha de uísque falsificado? É a morte. / Dos livros da Bíblia, qual o seu preferido? O “Eclesiastes”, aquilo é puro existencialismo. / Gosta da popularidade? Detesto. BELEZA MITOLÓGICA – Millôr Fernandes conta (no encarte do CD “A Dama do Encantado – tributo a Aracy de Almeida”, de Olivia Byington): “Nos últimos anos, a voz (de Aracy) era um pouco rouca nas conversas, continuava clara – e malandra! – no cantar, e não é desrespeito, mas alto elogio, lembrar seus seios mitológicos, que uma vez, em arroubo de mesa de bar, ali, num canto da boate Casablanca, mostrou desafiadora pra Antônio Maria e pra mim, na irrefreável vontade feminina de provar (“sic!”) que tinha mais do que voz bonita pra mostrar ao mundo.” DISCOGRAFIA MÍNIMA – 78rpm (4 álbuns) “Noel Rosa” (Continental, 1950/51); 10” “Sucessos de Aracy de Almeida” (acompanhada pela Orquestra do Vadico. Continental, 1956); LP “Aracy de Almeida, o samba em pessoa (RCA Camden, s/d); LP “Samba em pessoa” (Polydor, 1959); LP “Chave de ouro” (1962); LP “Samba é Aracy de Almeida” (Elenco, 1966); LP “Samba com Aracy” (Philips); LP “Aracy de Almeida interpreta Noel Rosa” (Continental, 1983); “Aracy de Almeida – As lágrimas podem secar” (Revivendo, 1989); LP “Aracy de Almeida – ao vivo e à vontade” (Continental); CD “Mestres da MPB – Noel Rosa – Aracy de Almeida (Continental/Warner, 1994); CD “Orlando Silva, Carmen Barbosa e Aracy de Almeida” (Revivendo, 1991); CD “Noel Rosa por Aracy de Almeida e Mário Reis” (Revivendo, 1992). ESPETÁCULOS – “Samba pede passagem” (1965); “Conversa de botequim”, direção de Miéle & Bôscoli (1965); “Que maravilha!”, com Jorge Ben, Paulinho da Viola & Toninho (1969). “A paixão de Noel segundo Aracy de Almeida”, direção: Hermínio Bello de Carvalho (1971), e.o. ESTRÉIA – Na Rádio Educadora, em 1933. Primeira gravação: “Em plena folia” (Colúmbia, 1934). FILMOGRAFIA – “Carnaval em lá maior”, de Ademar Gonzaga [1955]. JURADA – Como jurada de programa de auditório, trabalhou em “A Buzina do Chacrinha” e no “Programa do Sílvio Santos”. NOEL POR ARACY [I] – “Fui apresentada a uma porção de malandros, seus amigos. E passei a ir muito à sua casa, ao quartinho dos fundos, onde ele ficava de pijama de flanela, tomando sopa de feijão.” / “Noel era um cavalheiro. Muito brincalhão, debochado, nada bonito.” / “Noel gostava mesmo era dos botequins da Rua Carmo Neto, no Mangue. Ou daqueles por trás da Central. E eu cantava ‘pras’ meninas dele. Sempre mulatas. A Ceci, por exemplo, que tinha dente de ouro. Fiz muita boemia, freqüentei os piores botequins, com Noel, Chico Alves, Kid Pepe, Germano Augusto.” / “Se não fosse o Noel, talvez eu nem tivesse me tornado cantora.” / “Ele foi um cometa, uma passagem nesta vida.” (Jornal do Brasil. 02/05/1977). NOEL POR ARACY [II] – Aracy gravou de Noel Rosa: “Adeus” (NR, Ismael Silva & Francisco Alves) [1958]; “Amor de parceria” [1935]; “Até amanhã’ [1966]; “Cansei de pedir” [1955]; “Com que roupa?” [1951]; “Conversa de botequim” (NR & Vadico) [1950]; “Cor de cinza” [1955]; “De babado” [1966]; “Eu sei sofrer” [1937 e 1955]; “Eu vou pra Vila” [1958]; “Feitiço da Vila” (NR & Vadico) [1950 e 1966]; “Feitio de oração” (NR & Vadico) [1951]; “Fita amarela” [1955, 1966 e 1976]; “João-Ninguém” [1949]; “O maior castigo que eu te dou” [1937]; “A melhor do planeta” [1955]; “Meu barracão” [1955]; “Não tem tradução” [1950]; “Onde está a honestidade?” [s/d]; “O orvalho vem caindo” [1951]; “Palpite infeliz” [1936, 1950, 1966 e 1976]; “Pela décima vez” [1947]; “Pra me livrar do mal” (NR & Ismael Silva) [1932]; “Pra que mentir?” (NR & Vadico) [1951]; “Que baixo” (NR & Almirante) [1936]; “Rapaz folgado” [1938]; “Riso de criança” [1934]; “São coisas nossas” [1955]; “Século do progresso” [1937]; “Silêncio de um minuto” [1951]; “Só pode ser você” (NR & Vadico) [1937 e 1966]; “Suspiro” (NR & Orestes Barbosa) [s/d]; “Três apitos” [1951 e 1966]; “Triste cuíca” (NR & Hervê Cordovil) [1935]; “Último desejo” [1937 e 1950]; “Vitória” (NR & Romualdo Peixoto) [1958]; “Voltaste (pro subúrbio)” [1955] e “O X do problema” [1936]. OLIVIA BYINGTON – De todas as (poucas) homenagens já prestadas a Aracy, uma é destaque, o CD “A Dama do Encantado – Tributo a Aracy de Almeida”, da cantora Olivia Byington, lançado em 1997, pela WEA. Ou como disse Millôr Fernandes, no texto de apresentação, Olivia conseguiu: “gorjeando, chilreando, harpejando e transformando, com molejo próprio e gratidão indisfarçável, tudo o que revebeu de Aracy, ‘o samba em pessoa’.” VOZ DO MORTO, A – Em 1968, no auge da Tropicália, Caetano Veloso compôs e Aracy gravou “A voz do morto”, réquiem-manifesto-maior para Aracy: “Estamos aqui no tablado / feito de ouro e prata / e filó de nylon / eles querem salvar / as glórias nacionais / coitados // Ninguém me salva / ninguém me engana / eu sou alegre / eu sou contente / eu sou cigana / eu sou terrível / eu sou o samba / a voz do morto / os pés do torto / o cais do porto / a vez do louco / a paz do mundo / Na Glória...”