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PERFORMANCE: A ÚLTIMA FRONTEIRA DO ROCK
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15 de fevereiro de 2024 por Nísio Teixeira  
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De 30 de julho a 03 de agosto, estará acontecendo o “Seminário 8 – Corpografias: performance como linguagem”, no Centro de Cultura Belo Horizonte. Com debates, conversa on-line, palestra, performances e workshops. Entre os participantes: Antonio Risério, Arthur Omar, Nelson Soares (& Marcos Moreira Marcos, do Grivo), Lyslei de Souza Nascimento, Marcos Hill, Maria Inês de Almeida, Renato Cohen e Ricardo Aleixo. Cada participante enfocará um diálogo entre performance e outras expressões artísticas. Estarei fazendo a palestra “Performance: a última fornteira do rock”, dia 30 de agosto, às 20 horas. Em seguida, apresentarei a leitura-lírica-performática “Onoiticica # 100 (Abra seu Parangolé)”, com a Oficina Provisória de Experimentação Poética (OPEP-BR), integrada por: Ana Gusmão, Catarina Alves, Luciana de Paula e Mary Lisboa (performers), Francesco Napoli (guitarra e voz), Hector Gaete (contrabaixo e voz) e Cristiano Curinga (bateria). A apresentação não tem mistério, cruza e entrecruza a obra de Yoko Ono – tendo como base a música-mantra “Open yor box” / “Abra sua caixa” e cinco pequenas peças-performances “Do grapefruit” - com os parangolés de Hélio Oiticica. A cena é uma ilustração ou uma amplificação para a palestra. A palestra, sim, é que tem mistério. Uma grande e ampla incógnita funda toda a questão: “como falar de performance – experiência instantânea e volátil – à luz do rock, da indústria cultural, da cultura de massa (ou o nome que possa ter) – produto feito para o consumo? A performance nasce e morre no instante de sua ação, enquanto que a indústria pop só sobrevive se instaura produtos prontos e acabados. Qualquer artista pop só se inscreve na cena a partir de uma peça plausível, de medida de tempo determinada. A pop music, por mais que tente mostrar que não, só existe aristotelicamente. Isto é, tendo a fácil estrutura “início – meio – fim”. A performance, ao contrário, é godardiana por excelência. Tem “início – meio – fim”, mas não, exatamente, nessa ordem. A canção é a base da música pop; o instante, da performance. Uma canção pop está sempre no território do bom – ruim; a cena performática é a possibilidade e está além do bem e do mal do bom e do ruim. O happening já é uma outra história. Como ser eterno (no campo do pop) sendo volátil? Como inscrever o volátil no tempo exíguo da canção? A coisa se complica nessa relação – performance X rock -, quando fechamos mais o foco e vemos que, hoje, performance não é apenas performance; e rock, muito menos, é apenas rock. Sob as duas rubricas, repousam infinitos gigantes liliputianos. Não podemos mergulhar em um e outro mar e, como um escafandrista pós-adorniano, trazer à tona o que julgamos ser (e interessar) no rock e na performance. Temos que conviver com todas as possibilidades. Parafraseando Décio Pignatari – em seu “Interessere”, “na performance, interessa o que não é performance / no rock, interessa o que não é rock”. Por ora, fiquemos no supermercado das possibilidades e das variedades e das vaidades e das vicissitudes da performance. Do salto bashôniano – “Salto no vazio” – de Yves Klein, na pré-histórica Paris de 1962, aos dias atuais, o termo, o conceito e a experiência da e com a performance viraram pelo avesso. Performance, hoje, é tudo, para significar tão pouco. Se a bolsa de valores está em queda, dizem que “a performance da bolsa de valores não está correspondendo...”; um desfile (de moda, militar, etc.) é tratado com tintas e cores de performance; uma balada com drag-queen, submúsica tecno, pirotécnicos, etc. é vendida com performance; em propagandas de remédios milagrosos contra a impotência, ouvimos que é possível melhorar a performance...; etc. Em até minúsculos dicionários, lemos que performance é “realização, feito, façanha, atuação, desempenho, etc.”. Isto é, tudo é “p-e-r-f-o-r-m-a-n-c-e”. Do bocejar ao raciocinar. Do sexo à impotência. Então é assim? Fomos e vivemos enganados? Sim e não. A lição de Pignatari – do “interessere” – é mais do que válida. Qual a saída? Em alguns lugares, à direita, em outros, à esquerda, e, em outros ainda, onde desejarmos que seja, será. Porém, as opções básicas são: aceitar que tudo é performance e dançar a oca e vazia valsa tecno do nada e da coisa nenhuma ou radicalizar e repor, em cena, a performance como “ação”, como uma “intervenção sem mediação”. Aí (e aqui) voltamos ao enigma do início, se for assim, o rock não é espaço para essa radicalização. Como radicalizar com e no “efêmero” e na “ação”, construindo produtos acabados? Levando metaprodutos acabados, ou melhor, acabadíssimos, para o interior dos produtos. Contaminar o produto com mais vírus de “produto”; ou transformar (ou devolver) o produto à coisa inacabada, à coisa inútil. No campo da música pop, para ficarmos apenas no Brasil, temos vários exemplos desses metaprodutos acabados. Os álbuns: “Ou não”, de Walter Franco, “Araçá azul”, de Caetano Veloso, “As aventuras da Blitz”, da Blitz; “Essa tal de Gang 90”, da Gang 90 & Absurdettes; “Roots”, do Sepultura, “Severino”, do Paralamas de Sucesso. & Walter Smetak, Tom Zé, etc. Caetano Veloso & Mutantes & Johnny Dandurand em “Proibido proibir”, no festival de 68; A instauração de imagem pós-exílio de Caetano Veloso, em uma síntese de Mick Jagger & Carmen Miranda; Ney Matogrosso no Secos & Molhados; Walter Franco e Júlio Medaglia jogando dados no Festival Abertura; Jards Macalé, no mesmo festival, comendo rosas e balbuciando uma quase-canção; Arrigo Barnabé e suas póperas “Clara Crocodilo” e “Tubarões Voadores”, o espetáculo “Ouver”, de Augusto de Campos, Décio Pignatari, Haroldo de Campos e. o.; as obras de Arnaldo Antunes, etc. Explodir (em um sol de cinco sentidos) a gôndola dos supermercados com o instante de sua inutilidade. Usar o simples e o muito simples contra as paredes de jade de Gotham City. Pois nada mais “over” do que a superprodução de um show de rock. O rock para roqueiros; a performance para performáticos. Ou não. Jimi Hendrix no Woodstock fez um dos shows (performances) mais simples e, por isso mesmo, mais vitais de toda era do rock and roll. O Pink Floyd (pós-Syd Barrett), com seus P. A.’s de zilhões de watts e seus canhões que dariam para iluminar dez mil metrópoles, é o oposto disso. É o útil inútil disso. Os punks, que voltaram à mídia, têm o vírus dessa prática. Quanto menos, mais. Quanto mais direto, mais metafísico. Quando mais efêmero, mais perpétuo. Quando mais rápido, mais lenta será a digestão. Quando mais “insuportável” (para os ouvidos moucos da indústria), mais (anti) harmônico. Uma performance (no útero do rock and roll) deve ser isso: a reinstauração da surpresa, da vida, da pulsação. O resto? Ah... o resto!... Jogue nos versos de uma canção. E limpe as mãos no pano-de-prato das canções. Em tempo 1: hoje, às 16 horas, no Festival de Inverno de Ouro Preto, a Oficina Provisória de Experimentação Poética (OPEP-BR) apresentará a leitura-lírica-performática “Henriqueta-Purgatório-Dante”, em comemoração aos 100 anos da poeta Henriqueta Lisboa. Em tempo 2: Além das obras já citadas, vale um ouvido para: Alice Cooper (CD “Killer”); Augusto de Campos & Cid Campos (CD “Poesia é risco”); Bonzo Dog Doo Dah Band (CD2 “The history of The Bonzos”); Brian Eno & David Byrne (CD “My life in the Bush of Ghosts”): David Bowie (CD “Space Oddity” e CD “The rise ad fall of Ziggy Stardust and The Spiders From Mars”); Décio Pignatari, Livio Tragtenberg & Wilson Sukorski (CD “TemperaMental”); Frank Zappa & The Mothers of Invention (CD “We’re only in it for the money”); Laurie Anderson (CDs: “Big science”, “The United States live”; “Home of brave”, e. o.); Philadelpho Menezes (CD “Poesia sonora – do fonetismo às poéticas contemporâneas da voz” e CD “Poesia sonora hoje – uma antologia internacional”); The Beatles (CD St. Pepper’s lonely hearts club band” e CD2 “Álbum branco); e Yoko Ono (CD2 “Fly”; CD Yoko Ono/Plastic Ono Band; e CD “Walking on thin ice – compilation”). E olhos para: Hans Richter (“Dadá: arte e antiarte”); Hélio Oiticica (“Aspiro ao grande labirinto”); J. J. Lebel (“Happening”); John Cage (“De Segunda a um ano”, tradução de Rogério Duprat); Jorge Glusberg (“A arte da performance”); Renato Cohen (“Performance como linguagem”), Stewart Home (“Assalto à cultura – utopia subversão guerrilha na (anti) arte do século XX”) e Yoko Ono (“Do grapefruit”, traduções: Mônica Costa e Régis Bonvicino, e “Instruction paintings”).